RELIGIOSIDADE DE ESTUDANTES: TRAJETÓRIAS E PERSPECTIVAS ESCOLARES
Resultados de Um Survey no Rio de Janeiro

Diana Gomes da Silva Cerdeira1

        Embora se acredite que estamos em processo de secularização da sociedade, em decorrência dos avanços científicos e tecnológicos, houve no Brasil, um crescimento da adesão religiosa em geral, com destaque da pentecostal e neopentecostal - expressões religiosas que durante muito tempo foram marginalizadas pela sociedade (Valla e Fonseca, 2004). Este fenômeno tem sido objeto de inúmeras pesquisas, entretanto, na área de sociologia da educação, rara tem sido a produção acadêmica que pretende compreender as relações entre religiosidade e escolarização.

        Sabe-se que a religião pauta boa parte das ações dos indivíduos – dentro ou fora da escola. Além disso, pesquisas vêm mostrando que a religiosidade cresce entre jovens em idade escolar. Porque desconsiderá-la? A religiosidade se manifesta nas práticas escolares, através dos alunos, professores e funcionários mesmo que a escola seja laica. Sabe-se também, que o proselitismo religioso na escola pública sempre existiu: era comum a visita de padres e bispos para recolher dinheiro para fins da igreja alem de hábitos de fazer orações e a ostentação de símbolos religiosos que persistem até hoje.

        Este estudo trata de aspectos do perfil escolar de adolescentes cariocas articulados a aspectos sobre a religiosidade. O foco principal é compreender como o aspecto religioso se relaciona com o comportamento e a trajetória escolar do aluno, bem como, com suas expectativas de futuro e de escolarização. Esta tentativa evidenciou certas tendências que fortalecem a idéia de que a religião faz diferença e contribui com aspectos relevantes no perfil desses jovens pesquisados. Embora a diferença mais marcante esteja entre os alunos religiosos e alunos não religiosos, encontramos significativas diferenças entre as denominações religiosas, o que nos permite corroborar as hipóteses de que a religiosidade é de fato um aspecto relevante da vida escolar dos alunos.

        Nossa hipótese é de que a influência da religião e da subjetividade religiosa na conduta juvenil atrelada a outras variáveis, como , gênero, status sócio-econômico, trajetória escolar, expectativas de escolarização etc, contribua para formar um perfil dos alunos que ajude a compreender seu comportamento e desempenho escolar.

        O presente trabalho se constituiu enquanto um desdobramento da pesquisa na área de sociologia da educação “Educação e Exclusão Social - O Sagrado sob Ameaça”(2002) coordenada por Marcio da Costa, que parte da hipótese de que recentemente, vêm crescendo um sentimento de desvalorização da educação escolar, sobretudo nas camadas populares mais baixas. O survey se constituiu por aproximadamente dois mil e seiscentos (2600) estudantes do segundo segmento do Ensino fundamental, Ensino médio e turmas de EJA (Educação de Jovens e Adultos) de vinte e uma escolas, dentre elas públicas (estaduais e municipais) e privadas, em diferentes regiões da cidade do Rio de Janeiro que responderam os questionários no ano de 2003. Através do survey foi possível detectar características da população escolar destas regiões, associando-as às características religiosas coletadas. Optamos por analisar uma amostra de 2400 estudantes de dezesseis escolas, não incluindo os estudantes de EJA. Utilizaremos as questões 7, 7.1 e 7.2 do questionário2 como base para a análise de indicadores da religiosidade do estudante. Com informações sobre crença e freqüência religiosa, a partir dessas três questões, obtivemos sobre o estudante: a) se tem religião; b) caso sim, qual é a religião que pertence; c) qual a freqüência da prática religiosa - freqüência a templo, cujas respostas são: “mais de uma vez por semana”, “uma vez por semana”, “mais ou menos uma vez por mês”, “menos de uma vez por mês”, “raramente” e “não freqüento”. A partir daí, relacionamos estes indicadores de religiosidade à indicadores que nos revelam aspectos sobre a trajetória e percepções escolares dos alunos.

AS IMPLICAÇÕES DA RELIGIOSIDADE NO COMPORTAMENTO E NA TRAJETÓRIA ESCOLAR JUVENIL

        De acordo com Sposito (1997, 2005), recentemente, muitos estudos estão sendo produzidos com base numa abordagem que permite explorar as diversas concepções, experiências, ou seja, a vivência dos jovens, revelando assim que podemos considerar a existência de diversas “juventudes”. Estes estudos nos mostram as diferentes formas de experiência e sociabilidade juvenil. A família, a escola e a igreja, por exemplo, são instâncias de socialização formadoras da juventude. A escola e a igreja significam também para os jovens um espaço de interação social, nos quais se formam grupos que partilham os mesmos ideais.

        A literatura sobre juventude na área de sociologia de educação nos revela como se pensou e ainda pensa o jovem sob o rótulo de “problema social”, um estereótipo de rebelde que é tratado como algo “inerente” à juventude. Entretanto, os alunos com uma visão religiosa de mundo se afastam do estereótipo de “problemático” por terem incorporado a si os princípios morais de forma mais efetiva. Dessa forma, comparados aos demais jovens que se enquadram no estereótipo, apresentam uma postura mais disciplinada conforme o esperado por uma instituição escolar. Autores como Regina Novaes (2005), Vorraber Costa (2003) e o americano Christian Smith (2003) crêem que os jovens estão cada vez menos hostis em relação a assuntos religiosos, pois ainda que não apresentem forte inclinação para práticas religiosas, a ascensão de novas crenças e igrejas e também o contexto social e a influência da mídia tem oferecido diferentes “espiritualidades”. A pesquisa de Regina Novaes, nos revela resultados muito interessantes. Dentre os jovens que chegaram ao ensino superior encontramos proporcionalmente mais os que se declaram espíritas kardecistas, seguidos dos evangélicos não-pentecostais e ateus. Um outro dado interessante desta pesquisa é que são os pentecostais também os que mais se afastam do estereótipo de juventude: rebeldia, transgressão e “problema social” se aproximando de uma conduta moralmente “correta” sob a ótica da sociedade.

        Brenner, Dayrell e Carrano (2005) afirmam que os adolescentes estão se envolvendo mais com grupos jovens dentre eles grupos de igrejas, pois a igreja cresceu enquanto lócus de sociabilidade juvenil. Um percentual significativo declarou que freqüentar a igreja é uma forma de lazer em especial para os evangélicos. Seria preciso investigar até que ponto isso não seria sinal de baixa renda, ou seja, falta de condições financeiras para arcar com as despesas de atividades de lazer.

        Como já foi dito, nota-se no meio acadêmico uma carência de estudos que articulam religiosidade e experiência de escolarização. Nos EUA esses estudos vêm sendo produzidos há algum tempo: Richard Caputo (2004) pesquisou como a religiosidade dos pais incide sobre o comportamento de seus filhos adolescentes e chegou a conclusão que adolescentes cujos pais são mais religiosos tendem menos ao comportamento de risco, ou seja, delinqüência juvenil, vícios, gravidez precoce etc. Conseqüentemente, tendem a uma trajetória escolar mais regular. Os resultados podem ser resumidos ao seguinte esquema:



        De acordo com o esboço, identificamos a religiosidade enquanto um dos aspectos que interferem, ainda que indiretamente, na trajetória escolar dos alunos.

        Reforçando as conclusões de Caputo (2004), Smith et al (2003) também afirmam que a religiosidade influencia os relacionamentos familiares, a interação social e o comportamento (tende a não ser um comportamento de risco). Conclui-se que aparentemente a religiosidade não altera conforme a idade, ou seja, conforme os indivíduos vão envelhecendo. Estudos americanos em geral apontam que os mais religiosos alcançam níveis mais altos de escolarização, no entanto quanto maior é a escolarização maior é a tendência do indivíduo vir a se tornar cético. Esses indivíduos inicialmente muito influenciados pelos dogmas religiosos têm um bom comportamento e rendimento escolar, seguindo sua trajetória com sucesso. À medida que crescem e vão aumentando o grau de escolaridade, vão se tornando mais céticos, principalmente quando chegam à universidade, e de certa forma, essas influências tendem a diminuir. Ainda que essa tendência se apresente na maioria dos casos, não podemos afirmar que os princípios morais religiosos se enfraquecem ou desaparecem ao longo da vida dos indivíduos, pois alguns estudos confirmam que a religiosidade não se altera conforme o envelhecimento. Por outro lado, outros autores crêem que essa socialização primária e religiosa não tende a enfraquecer.

DESCRIÇÃO DOS DADOS E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Perfil Geral da Amostra

        Dos estudantes contemplados na amostra, 18,5 % declararam não ter religião, contra 81,5 % que declararam ter. Dos jovens que afirmaram ter religião, 60,3 % são católicos, 5,3 % são evangélicos tradicionais, 24,2 % são evangélicos novos (neopentecostais e pentecostais3 ), 4,3 % são espíritas e 1,6% são testemunhas de Jeová. Os que declararam pertencer a outras denominações como umbanda, budismo, igreja messiânica e judaísmo serão desconsiderados da análise por somarem um número reduzido na amostra. Com relação à freqüência a templo religioso, 26,7% declararam que não costumam ir a templos (ainda que tenham declarado pertencer a alguma religião), enquanto que 21,6% disseram que costumam freqüentar uma vez por semana. Dentre os estudantes do sexo feminino, 59,1 % declararam ter religião. Já entre os estudantes do sexo masculino o percentual é de 40,9%. Dentre os que não tem religião a maioria é composta por homens (62,2 %). As mulheres se declaram mais religiosas que os homens, em concomitância, os índices de freqüência a templo sobem entre as mulheres e caem entre os homens.

        De acordo com as afirmações de Valla e Fonseca (2004) de que a emergência das religiões evangélicas neopentecostais vem ocorrendo, sobretudo nas classes populares, nossos dados confirmam que os evangélicos novos estão principalmente na rede pública de ensino e na zona oeste da cidade, essas informações indicam de fato, um nível sócio-econômico mais baixo desta denominação religiosa. Em contrapartida, o espiritismo pode estar crescendo no seio da classe média, tanto por se concentrar na Zona Sul e Tijuca como por se concentrar na rede privada de ensino – ainda que alguns desses colégios particulares sejam católicos. Isso nos mostra que as famílias que têm condições de pagar um colégio escolhem colégios católicos, não por serem católicas, mas pela qualidade de ensino4 .

        Sabe-se que a soma de bens domésticos também é um indicador de situação sócio-econômica. Em nossa pesquisa, observou-se que os que não têm religião apresentam menos bens domésticos do que os que têm. Dentre os que têm religião, os evangélicos novos seguidos dos Testemunhas de Jeová são os que apresentam menor soma de bens domésticos. No topo do ranking vem os espíritas com o maior índice de bens (gráfico 1)5 . Ao mesmo tempo, o nível socioeconômico apresenta um comportamento interessante, sendo relativamente baixo entre os que não freqüentam a templo, crescendo para as faixas seguintes de freqüência e caindo acentuadamente, conforme o hábito de freqüência a templo religioso se torna algo cotidiano na vida dos respondentes. Notou-se que os testemunhas de Jeová seguido dos evangélicos novos e tradicionais, são os que declararam maior freqüência a templo.

Religiosidade, Comportamento e Perfil do Aluno

        Os estudantes que declararam ter religião dão mais importância ao estudo (estudar, ler, fazer dever de casa), à instituição escolar, além de apresentarem uma trajetória escolar mais regular do que aqueles que declararam não ter religião. Estes últimos são os mais defasados na escola, seguido dos evangélicos novos (repetiram ou já abandonaram a escola alguma vez). Os espíritas, testemunhas de Jeová e os evangélicos tradicionais são os menos defasados. Os espíritas e católicos começaram a estudar mais cedo, além de que as mães dos espíritas têm em média mais anos de escolaridade. Já os evangélicos novos, ingressam na escola mais tarde, apresentando trajetórias escolares mais defasadas e suas mães possuem menos anos de escolaridade. De acordo com o gráfico 26 , os que mais disseram fazer tarefas escolares, estudar e ler são os alunos testemunhas de Jeová, seguidos dos espíritas e evangélicos novos. Os católicos e os evangélicos tradicionais são as duas religiões que apresentam um índice mais baixo na valorização do estudo. Nesse ponto, nossos dados se defrontam com as afirmações de Novaes (2005) citadas no presente estudo de que as religiões evangélicas tradicionais (não-pentecostais) dispõem de características históricas de valorização do estudo, pois em nossa pesquisa fica claro o baixo índice de estudo e leitura por parte desta denominação. Por outro lado, por serem rigorosos, os evangélicos tradicionais podem estar insatisfeitos com a freqüência com que estudam e ainda que estudem razoavelmente, declararam baixa freqüência de estudo e leitura. Para reforçar nossas hipóteses, podemos observar na tabela 1, que são os evangélicos tradicionais que mais se interessam por fazer cursos extra-escolares (média = 1,17).

        Com relação à avaliação escolar7 , os estudantes avaliam se estão ou não satisfeitos com sua escola. Os católicos e os sem religião são os mais satisfeitos, pois avaliam mais positivamente suas escolas. Já os mais insatisfeitos são os evangélicos tradicionais seguidos dos espíritas (Gráfico 3). Podemos analisar também a avaliação que os alunos fazem de si mesmo8 , ou seja, se consideram “bons” ou “maus” alunos, no que diz respeito ao comportamento e desempenho escolar. Os sem religião acentuadamente atribuem a si a característica de “mau aluno”, seguidos dos evangélicos tradicionais (mais uma vez notamos que os evangélicos tradicionais podem estar sendo rigorosos com eles mesmos). Já entre os que se consideram “bons alunos” a maior parte é de evangélicos novos seguidos dos Testemunhas de Jeová. (Gráfico 4).

        Os evangélicos em geral (tradicionais e novos) e testemunhas de Jeová, realizam menos atividades de lazer como ir ao cinema, shows e festas9 . Por outro lado, os espíritas são os que mais declararam sair para a “balada”. Estes fatos podem estar ligados a questões de crença e prática religiosa, visto que os evangélicos e testemunhas de Jeová são mais rigorosos além de freqüentarem mais a Igreja. Segundo Novaes (2005) os evangélicos são os que mais consideram ir a igreja como uma forma de lazer. No entanto, nossos dados apontam que os espíritas são os que têm melhores condições socioeconômicas e conseqüentemente mais condições de arcar com as despesas das “baladas” (Gráfico 5).

        Os dados nos mostram que os estudantes que mais freqüentam a igreja são também aqueles que dão mais importância ao estudo e à leitura. São também os que menos saem para as “baladas” e os que mais acreditam em fatores meritocráticos (esforço, estudo , trabalho), provavelmente porque acreditam mais na importância da escola. Inversamente, os que não freqüentam o templo são os que dão menos importância ao estudo. O gráfico 610 , nos mostra a importância da escola para os religiosos e não-religiosos. Observamos uma nítida depreciação11 da escola por parte dos que declararam não ter religião.

Religiosidade e Expectativas de Escolarização

        Em relação à expectativa de futuro, os não religiosos, bem como os espíritas, não consideram muito importantes os fatores meritocráticos (esforço, estudo , trabalho) nem os fatores fortuitos12 (sorte, conhecer as pessoas certas) para ascenderem socialmente. Os católicos, apesar de considerarem os dois fatores, apresentam-se ligeiramente inclinados a considerarem mais importante os fatores fortuitos. Inversamente, os evangélicos em geral dão mais importância aos fatores meritocráticos.

        O questionário de nossa pesquisa permite coletar informações sobre as expectativas de futuro dos estudantes. Na questão 28, cuja pergunta é O que acha que estará fazendo daqui a dois anos?, obtivemos respostas interessantes, por exemplo, os espíritas são os que mais almejam cursar o ensino superior (82,7%), seguidos dos não religiosos (64%). Além disso, os espíritas são os que menos desejam trabalhar neste período próximo de dois anos (talvez pela situação socioeconômica mais confortável). Os Testemunhas de Jeová, ao contrário dos espíritas, são os que menos aspiram a carreira superior (36,7%) e mais aspiram trabalhar nesse período (53,3%). Esses dados, conferimos na tabela 2.

        Por fim, para apresentarmos de forma mais compreensível as expectativas de escolarização futura dos alunos de acordo com as denominações religiosas que declaram pertencer, criamos uma variável que representa as respostas dos entrevistados às questões Até que série acha que vai estudar e Até que série gostaria de estudar, respectivamente as questões 46 e 47 do questionário. Os sem religião se mostram nitidamente com as menores expectativas de escolarização, ainda que o índice de aspiração ao ensino superior seja um dos mais altos, conforme mostra a tabela anterior. Como era previsível, os espíritas são os mais otimistas em relação às expectativas de escolarização. Os resultados dessa média de “expectativas de escolarização” por religião são parcialmente condizentes com hierarquias de nível socioeconômico observadas, mas há também importantes dissonâncias que podem ser objeto de outras reflexões futuras, acentuando a importância das diferenças culturais religiosas (gráfico 7). Lembramos que a variável “expectativa de escolarização”13 , pode nos dar pistas sobre o que pensam os estudantes com relação à educação, ou melhor, até que ponto consideram a escola uma instituição importante em suas vidas, sobretudo, no que diz respeito à crença de que a escolaridade pode vir a ser um veículo de ascensão social.

        Algumas tendências gerais puderam ser percebidas ao longo deste estudo, ainda que existam pequenas variações, como por exemplo, a nítida oposição de alguns resultados entre os não-religiosos e os religiosos. Os primeiros apresentam trajetórias escolares mais defasadas, dão menos importância ao estudo e leitura e à instituição escolar, e conseqüentemente atribuem menos valor à educação. Caputo (2004) afirma que estudantes não-religiosos de famílias não-religiosas tendem a um comportamento de risco e a depreciação da escola e da educação, resultando em menos anos de escolarização, conforme o esboço da página 3. Os não-religiosos se consideram em maior proporção “maus alunos” e são menos críticos ao avaliarem suas escolas, ao contrário dos religiosos que são mais críticos e insatisfeitos. Um dado, no entanto, nos parece um tanto paradoxal, pois os não-religiosos são os que menos apresentam expectativas de escolarização futura, mas apresentam o segundo maior índice de aspiração ao ensino superior.

        Uma segunda tendência, e é para esta que chamamos mais atenção, se refere às diferenças entre as denominações religiosas. Os católicos e principalmente os espíritas estão mais presentes em regiões de classe média da cidade (Tijuca e Zona Sul), são os que menos freqüentam a templo e os que parecem ter melhor condição socioeconômica. Essas denominações começaram a estudar mais cedo, apresentam trajetórias escolares menos defasadas, e suas mães apresentam em média mais anos de escolaridade. Os espíritas são os que mais têm expectativas de escolarização e desejam cursar o ensino superior. Estes são também os mais “baladeiros”. Pelo contrário, os evangélicos e testemunhas de Jeová se concentram em regiões periféricas da cidade (zona norte e oeste), são os que mais freqüentam a templo e os que parecem ter menos condições socioeconômicas. Os evangélicos novos começaram a estudar mais tarde, apresentam trajetórias escolares mais defasadas e suas mães possuem em média menos anos de escolaridade. Os estudantes destas denominações se consideram bons alunos, são os que menos saem para a “balada” e os que mais consideram os fatores meritocráticos em suas vidas, sendo otimistas em relação às expectativas de escolarização futura.

        De maneira geral, os religiosos parecem dar mais importância à educação e aos valores escolares, além de se mostrarem mais otimistas com relação ao futuro, respeitando, é claro, as diferenças existentes entre as denominações religiosas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

        O interesse por pesquisar o perfil escolar - trajetória, defasagem, avaliação da escola e expectativas de escolarização – da juventude carioca, surgiu devido à carência de estudos empíricos que nos revelam um pouco do que pensam esses estudantes e quais os fatores contribuem para a formação deste perfil. Os estudos que tratam da religião e da religiosidade enquanto um fator essencial na experiência de escolarização dos indivíduos são ainda mais escassos e deixam uma lacuna na literatura acadêmica brasileira.

        A tentativa de relacionar dados sobre a religiosidade dos alunos com algumas informações sobre a experiência de escolarização dos estudantes e informações que revelam um pouco de sua família e do meio social em que vivem, evidenciou certas tendências que fortalecem a idéia de que a religião, ou melhor, a religiosidade faz diferença e contribui com aspectos relevantes no perfil desses jovens pesquisados. Esses dados podem indicar que uma amostra heterogênea de jovens estudantes do Rio de Janeiro possui uma expressiva diversidade cultural religiosa, que precisa ser mais bem investigada enquanto uma característica relevante que pauta as ações dos indivíduos e, portanto, não podem ausentar-se da compreensão dos fenômenos sociais e escolares.

        Espera-se que as análises exploratórias presentes nesse estudo contribuam para um entendimento da relação entre os hábitos religiosos dos jovens alunos e seu processo de escolarização. Ainda que os resultados não possam ser generalizados, pois esta não é uma amostra representativa do universo de estudantes do Rio de Janeiro, apresentam, conforme dito anteriormente, certas tendências que podem e devem ser melhor exploradas, incluindo análises multivariadas e procedimentos mais sofisticados de tratamento dos dados.

        O jovem, atualmente, não pode mais ser compreendido apenas sob o rótulo de “problema social” ou sob qualquer categoria isolada, visto que muitos espaços e experiências socializadoras o constituem. A descrição de algumas práticas culturais e hábitos religiosos, além de outras informações importantes de nossa amostra permitiu compreender que existe uma multiplicidade de dimensões que contribuem para construir a condição juvenil, condição esta que nos revela também, uma multiplicidade de juventudes.




1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontífice Universidade Católica do Rio de Janeiro, integrante do SOCED.

2 Os questionários foram codificados e analisados no SPSS - programa estatístico de análise de dados quantitativos.

3 Dividimos os evangélicos em duas categorias: “evangélicos tradicionais”, que como o nome sugere abarca igrejas de maior tradição, tais como, Batista, Metodista, etc; e “evangélicos novos”, pentecostais e neopentecostais, tais como, Igreja Universal e Assembléia de Deus.

4 No caso dessa pesquisa, há um certo desvio na análise das redes provocado pela presença de uma escola privada, em região bem pobre da cidade, vinculada a um trabalho social da Igreja Batista. Esse fato deve contribuir para aumentar o número dos “evangélicos tradicionais” entre os alunos da rede privada.

5 Os gráficos e tabelas se encontram em anexo.

6 A variável “estudo” (ler, estudar) é uma variável padronizada que representa o somatório das declarações dos entrevistados na questão 15 do questionário, nos tópicos: “Fazer tarefas da escola/estudar” e “ler’, tomadas em escala ordinal. Para ambos tópicos as respostas possíveis são: “diariamente”; “quase todo dia”; “às vezes”; “raramente”; e “não costuma”.

7 A variável “avaliação da escola” (satisfação com a escola) foi composta pelo somatório das respostas dadas aos diversos sub itens da pergunta 36 e pela pergunta 37.

8 A variável “se considera um aluno” foi composta pelo somatório padronizado das respostas à questão 40 do questionário.

9 A variável “balada” (atividades de lazer) foi composta pelo somatório das declarações dos entrevistados na questão 15 do questionário, nos tópicos: “ir ao cinema”, “ir ao teatro”, “ir a festas ou bailes”, ‘ir a shows”, “ir a praia”, e “ir a parques/passear”.

10 A variável “nota para importância da escola” foi composta pelo somatório padronizado das respostas à questão 49 do questionário.

11 Os estudantes foram chamados a atribuir uma nota de zero a dez para a importância da escola em suas vidas (questão 49). De maneira geral, quase todos atribuem notas elevadas, o que indica um certo viés no instrumento de pesquisa. Entretanto, ao trabalharmos com a medida padronizada, diferenças aparecem.

12 As variáveis “fatores meritocráticos” e “fatores fortuitos” foram compostas pelo somatório das respostas dadas aos diversos sub itens da pergunta 32, posteriormente padronizada. “Dar sorte”, “conhecer as pessoas certas”, “ter boa aparência” compõem o fator “fortuito”. “Trabalhar duro” e “estudar muito” integram o fator “meritocrático” (por análise fatorial).

13 A variável “expectativa de escolarização” foi gerada a partir de uma análise fatorial em que se buscava resumir a avaliação da escola feita pelos alunos e suas expectativas de escolarização futura (“até que série acha que vai estudar” e “até que série gostaria de estudar”). Tal análise revelou a independência plena entre essas duas dimensões: “avaliação da escola” e “expectativas de escolarização”, contrariando nossa suposição de que estariam relacionadas.










REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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CAPUTO, Richard K.. Parent Religiosity, Family Processes, and Adolescent Outcomes. Families in Society: Journal Comtemporary Social Service, 2004.

COSTA, Marcio. Educação e Exclusão Social – O Sagrado sob Ameaça. Projeto de Pesquisa submetido ao CNPq: Departamento de Educação da UFRJ, 2002.

NOVAES, Regina. Juventude, Percepções e Comportamentos: A Religião Faz Diferença? In: ABRAMO, H. W. e BRANCO, P.P.M. (Orgs.). Retratos da Juventude Brasileira – Análises de uma Pesquisa Nacional. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo/ Instituto Cidadania, 2005.

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VORRABER COSTA, Marisa. (org.) A Escola tem Futuro? Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2003.

SPOSITO, Marília Pontes.Algumas Reflexões e Muitas Indagações sobre as Relações entre Juventude e Escola no Brasil. In: ABRAMO, H. W. e BRANCO, P.P.M. (Orgs.). Retratos da Juventude Brasileira – Análises de uma Pesquisa Nacional. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo/ Instituto Cidadania, 2005.

__________. Estudos Sobre Juventude em Educação. Revista Brasileira de Educação. n. 5-6, São Paulo: Anped, 1997.






ANEXO 1

Gráfico 1



Gráfico 2



Tabela 1



Gráfico 3



Gráfico 4



Gráfico 5



Gráfico 6



Tabela 2



Gráfico 7